março 29 2023, 19:09
Dia 30 de março é Dia Mundial do Transtorno Bipolar, uma data para trazer conscientização ao redor dessa doença mental mal conhecida, estigmatizada e que traz muito sofrimento para quem é portador e também para as pessoas a sua volta.
A data foi escolhida por ser aniversário do artista Vincent Van Gogh, postumamente diagnosticado como bipolar.
O diagnóstico
Eu fui diagnosticada com transtorno bipolar há mais de 10 anos, mas meu primeiro diagnóstico aos 24 anos foi o de depressão. Após alguns anos e várias crises de depressão veio um novo diagnóstico: transtorno bipolar, e com ele um mix de desespero, afinal de contas é uma doença que assusta e é para o resto da vida, mas também de alívio, por entender que o que eu estava passando tinha nome e consequentemente tratamento.
O transtorno bipolar é conhecido por sua alternância entre fases de depressão, e fases de mania ou hipomania, com intervalos de estabilidade (eutimia). Mas não é só o humor que está alterado, para cima e para baixo, há também alterações no nível de energia, pensamentos, sentimentos, comportamentos, trazendo muitos prejuízos se não for adequadamente tratado.
É uma doença do cérebro e carrega muito estigma e preconceitos. As pessoas tem vergonha de falar sobre isso. Até poucos anos atrás eu também não me sentia à vontade para contar às pessoas ao meu redor.
A boa notícia é que é possível alcançar a estabilidade (não existe cura), com tratamento medicamentoso adequado aliado a outras medidas como psicoterapia e mudanças no estilo de vida.
A maternidade
Um dos meus maiores desafios foi me tornar mãe. Imagine só juntar as variações hormonais da gravidez e pós-parto às variações já inerentes ao transtorno bipolar. Sempre sonhei com isso e planejei mas apesar de conhecer alguns riscos associados não imaginava que podia sofrer de depressão já na gravidez.
Já sabia da depressão pós-parto, mas não que metade das depressões pós-parto já se iniciaram na gravidez, ninguém conta isso para você. Foi muito frustrante não conseguir me conectar emocionalmente com minha bebê nem na barriga, nem depois dela nascer, não curtir cada momento da gravidez (e te falam que é para você se sentir plena) e mal dar conta dela no pós-parto porque já não dava conta de mim mesmo.
E apesar de ter rede de apoio não me sentia confortável para dividir certos pensamentos e sentimentos
pois tinha muita vergonha deles. Assim, além da frustração e vergonha veio o sentimento de culpa por não ser uma “boa mãe”, por não conseguir cuidar adequadamente dessa bebê que precisava tanto de mim.
Só aprendi com o tempo que se a gente não se cuida, não podemos cuidar de ninguém, então foi necessário esse tempo para me reerguer e voltar a dar conta dos cuidados físicos e emocionais que a bebê precisava. Com um novo tratamento psiquiátrico, apoio psicológico e rede de apoio em casa após alguns meses consegui me restabelecer, e assumir pouco a pouco plenamente a maternidade.
O puerpério é a fase mais delicada para toda mãe, e não é diferente para mulher bipolar. Pode até ser pior pois a privação de sono pode desencadear uma crise no transtorno bipolar de depressão, ou de mania/hipomania.
A transformação
A maternidade foi para mim um gatilho de crise, mas também um gatilho de transformação.
Quando me tornei mãe, revi minha vida profissional, minhas prioridades e meu propósito de vida. Através da necessidade de transformação da minha própria história nasceu uma missão de ajudar outras mulheres e mães trazendo conteúdos para promover conscientização, prevenção e autocuidado. Assim nasceu a Mães com Humores para apoiar à causa da saúde mental materna. Hoje olho nos olhos da minha filha e sinto orgulho da mãe que eu me tornei, e só sim uma “boa mãe”.
Foto: Taba Benedicto/ Estadão
Autora: Christelle Maillet, mãe da Chloé, fundadora da Mães com Humores, um canal de divulgação (www.instagram.com/maescomhumores) , criação e curadoria de conteúdos e eventos sobre saúde mental materna, além de um grupo de apoio para mães e futuras mães
com depressão ou transtorno bipolar.
Roberta Vieira - 31/03/2023
Que texto incrível! Parabéns pelo trabalho. Sou fonoaudióloga e trabalho com adolescentes em sofrimento psíquico. Sempre penso que muitas das "minhas" adolescentes serão mães. Meu trabalho é, al de olhar para elas, preparar maternagem que um dia virá... e cuidar da constituição linguistica dos bebês que virão. É assim, um trabalho de promoção de saúde. Me identifiquei muito com seu texto e sua trajetória.
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